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A DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO CPOM E AS ATIVIDADES DE PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO

Por Flavio Luis Vieira Souza 

Em sessão finalizada em 27/02/2021 foi reconhecido pelo STF que é incompatível com a Constituição Federal a exigência de cadastro em órgão da Administração municipal, de empresas prestadoras de serviços não estabelecidas no território do Município e imposição ao tomador de efetuar a retenção do Imposto Sobre Serviços – ISS quando descumprida tal obrigação acessória, julgamento sob a égide da repercussão geral que analisou a inconstitucionalidade do artigo 9º caput e §2º da Lei nº 13.701/2003 do município de São Paulo, que atribuiu ao tomador de serviço a responsabilidade pela retenção e recolhimento do ISS de empresas prestadoras de serviços de outros municípios não cadastradas.

Embora a decisão tenha avaliado a legislação que criou o CPOM paulistano, abre importante precedente em relação à normas semelhantes que existem em mais de 70 municípios, como o Rio de Janeiro, onde denomina-se Cadastro de Empresas Prestadoras de Outros Municípios – CEPOM, assim como em outras localidades com denominações como CENE, DANFOM, DANFS-e, DSR, RANFS. Denominações diferentes, mas objetivos em comum, qual seja, a redução das perdas provocadas pela guerra fiscal, que estimulam o deslocamento de empresas por meio da redução da alíquota do ISS, situação que pode ensejar muitos procedimentos de planejamento tributário.

Estas normas propagaram-se no auge da guerra fiscal entre municípios, onde os incentivos concedidos por municípios economicamente menores, proporcionavam uma redução significativa do ISS, não apenas pela alíquota menor, mas em algumas situações a alíquota reduzida era aplicada em concomitância com a concessão de reduções de base de cálculo, que resultava indiretamente, em carga tributária menor que a alíquota mínima estabelecida pela Lei Complementar nº 116/2003 (2%), situação expressamente vedada a partir da publicação da Lei complementar 157/2016, que repute como nula qualquer Lei que conceda estas benesses tributárias.

A obrigação julgada inconstitucional ocasiona em muitos casos efeito contrário, pois o deslocamento de empresas em busca de economia tributária geraria diante da ausência de cadastro do prestador o aumento do ônus tributário, ocasionando bitributação, uma vez que, o tomador de serviços é obrigado a efetuar a retenção do ISS, para ilidir a responsabilidade tributária, contudo o prestador permanece obrigado a recolher o mesmo tributo, incidente sobre o mesmo fato gerador, para o município do local do estabelecimento, o qual é o sujeito ativo da obrigação tributária.

A ausência do cadastro não é mera falta de ação das empresas, e sim decorre de dificuldades criadas para a sua obtenção, mediante exigências como por exemplo, a apresentação das faturas de energia elétrica e serviços de telefonia do último semestre, constando o endereço, fotografias com imagens das instalações internas e fachada frontal, além da desqualificação de documentos fiscais autorizados por outros municípios. Em muitos casos esta questão é solucionada com contenciosos judiciais com o objetivo de fazer com que o município efetue o cadastro.

Cabe destacar que a medida facilita em muito as ações dos municípios reduzindo procedimentos administrativos de apuração de tributos. É comum identificarmos empresas que extrapolam os limites da elisão tributária por meio de deslocamentos ilegítimos, pois embora a empresa esteja formalmente registrada em um município, na essência a prestação efetiva do serviço ocorre em outra localidade, evidenciando clara simulação.

Ao reconhecer repercussão geral o STF determina que os demais órgãos jurisdicionais se direcionem de acordo com o entendimento da Suprema Corte. Assim a decisão abre um importante precedente para aplicação em outros cadastros de prestadores de serviço, contudo esta aplicação não é imediata, pois para que os efeitos pretendidos sejam observados haverá a necessidade de ajuizamento de ações judiciais, uma vez que as decisões em recurso extraordinário em repercussão geral proferidas pelo STF possuem efeito vinculante somente em relação aos órgãos do Poder Judiciário.

As normas permanecerão inalteradas até que sejam revogadas expressamente. Cumpre ainda destacar que os efeitos da decisão ainda não foram modulados, e desta forma a inconstitucionalidade permite aos contribuintes que sofreram a retenção pleitear a restituição dos valores recolhidos.

Resta evidente que a decisão do STF ocasionará a redução da arrecadação dos municípios de maior poder econômico que adotaram este procedimento, exigindo a reformulação da obrigação tributária, talvez para o simples fornecimento de informações, objetivando intensificar as atividades de fiscalização, no intuito de identificar onde o fato gerador foi praticado, contudo a decisão de forma alguma referenda planejamentos tributários abusivos, pois embora a obrigação acessória tenha sido declarada inconstitucional, a mesma não impede que municípios constituam créditos tributários, se restar evidenciado que o fato gerador da obrigação tributária, a prestação dos serviços, foi praticada em seu território, não importando que o tributo já tenha sido recolhido a outro sujeito ativo.

O pressuposto de todo planejamento tributário é a liberdade outorgada pela ordem jurídica às pessoas em geral de organizar licitamente seus negócios jurídicos. Desta forma a liberdade de escolhas entre ações ou omissões igualmente válidas é o pressuposto de todo planejamento tributário que legitima a ação dos particulares sujeitos ao poder de tributar que advém do pacto constitucional.

As regras econômicas determinam que os atos empresariais devam estar voltados para a obtenção do maior lucro possível com o menor custo, quando do exercício das atividades econômicas permitindo desta forma a maximização de seu valor de mercado, aumentando as riquezas de seus proprietários. Toda atividade de planejamento tributário envolve a tomada de posições frente questões de diversos matizes éticos e sob a ótica da liberdade fiscal, é direito do contribuinte valer-se dos meios juridicamente lícitos postos à sua disposição, para organizar sua situação tributária frente ao fisco de acordo coma sua capacidade contributiva, todavia, este direito não é absoluto e incontrastável em seu exercício, tendo em vista que a convivência social é informada pelo princípio da solidariedade social e não pelo individualismo exacerbado.

A caracterização de uma atividade como planejamento tributário dependerá da análise do caso concreto. Se for constatado que o ato encontra amparo no ordenamento jurídico deve o ato ser aceito e respeitados pelo fisco, caso contrário, estaremos diante de uma hipótese de evasão.

O Código Tributário Nacional em várias passagens menciona “fraude, dolo e simulação”, como causa excludente de prazos extintivos, revisão de lançamento pela autoridade administrativa, vedação a moratória, etc. Ainda faz previsão no art. 116 parágrafo único do termo. Entretanto a definição não se encontra no CTN, uma vez que tais institutos exceto dissimulação são pertencentes ao Direito Privado e Penal e não ao Direito Tributário. Entende-se por simulação o artifício ou fingimento na prática ou na execução de um ato, ou contrato com a intenção de enganar ou de mostrar o irreal como verdadeiro, ou lhe dando aparência que não possui. Assim se comprovado a prática de simulação pode o fisco constituir o crédito tributário.

O Código Civil estabelece no Art. 167 que é nulo o negócio jurídico simulado citando como uma das causas a declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira. Frise-se que as atividades de planejamento tributário devem ser realizadas antes da ocorrência do fato gerador e sempre amparadas na licitude e legitimidade dos atos.

Importante destacar que o Art. 4º da Lei complementar 116/2003 define como estabelecimento prestador, o local onde o contribuinte desenvolva a atividade de prestar serviços, de modo permanente ou temporário, e que configure unidade econômica ou profissional, sendo irrelevantes para caracterizá-lo as denominações de sede, filial, agência, posto de atendimento, sucursal, escritório de representação ou contato ou quaisquer outras que venham a ser utilizadas.

Assim não basta a empresa ter seus atos constitutivos e documentos fiscais autorizados por um determinado município. É de suma importância para que este tipo de deslocamento de empresa possa ser considerado como planejamento tributário que de fato a empresa realize a prestação de serviços naquela localidade, pois do contrário os fiscos municipais poderiam invocar o princípio da primazia da essência sob a forma, comprovando a ocorrência de prática de simulação, desconsiderando os fatos praticados, e constituindo o crédito tributário. A declaração de inconstitucionalidade do CPON não pôs fim a bitributação do ISS, antes apenas amparou empresas que eram prejudicadas pelos rigores ilegais das normas. A evidenciação de prática de simulação terá o mesmo efeito da norma atacada, pois o contribuinte será obrigado a recolher o tributo para o município em que o serviço foi prestado, em que pese já ter recolhido o mesmo tributo que incidiu sobre idêntico fato gerador ao município que autorizou a emissão dos documentos fiscais.

Fonte: Tributário

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