RECEITA LIMITA DEDUÇÃO DE JUROS DO CÁLCULO DO IRPJ
A Receita Federal entendeu que juros pagos em parcelamento não podem ser deduzidos da base de cálculo do Imposto de Renda (IRPJ) e da CSLL pelo lucro real. Só haveria esse direito se esses tributos fossem dedutíveis. A decisão está na Solução de Consulta nº 101, publicada pela Coordenação-Geral de Tributação (Cosit).
O texto, que vale como orientação para todos os fiscais do país, deixou tributaristas preocupados, já que esse não era o entendimento vigente. E da forma como está escrito, segundo eles, empresas fora de parcelamentos também poderiam ser autuadas pela Receita Federal.
“Minha primeira reação ao ver a solução de consulta foi me perguntar por que alguém foi perguntar isso pra Receita”, afirma um advogado que prefere não ser identificado. De acordo com o tributarista, não havia dúvida sobre o assunto e as empresas conseguiam deduzir valores de juros sobre dívidas do cálculo do IRPJ e da CSLL.
A consulta foi feita por uma empresa atacadista que aderiu ao Programa Especial de Regularização Tributária (Pert) em 2017. A empresa pagou 20% da dívida sem deduções, em cinco parcelas, e o resto em 145 parcelas a partir de 2018. Foram inscritos no parcelamento dívidas de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins e IPI.
A empresa perguntou à Receita se poderia deduzir juros incidentes sobre as parcelas e sobre a multa de ofício da base dos tributos. O regulamento do Imposto de Renda prevê que os juros pagos ou incorridos podem ser deduzidos como despesa financeira na apuração do lucro real.
Na resposta, o Fisco diz que, na apuração do lucro real, os juros (Selic) sobre o saldo devedor e cada prestação do Pert são considerados despesas financeiras e em, regra geral, dedutíveis. Mas limita esse entendimento.
“Tais juros somente são dedutíveis quando incidentes sobre despesas dedutíveis, sendo, por conseguinte, indedutíveis quando incidentes sobre o próprio imposto, assim como quando incidentes sobre as multas de ofício”, afirma na resposta.
A Receita cita que, segundo a Solução de Consulta nº 66, de 2011, os juros de mora, por se tratarem de compensação pelo atraso na liquidação de débitos, caracterizam-se como despesa financeira e como tal são dedutíveis, mas em solução de consulta interna de 2012 já havia considerado que a regra deve ser a aplicada aos tributos sobre os quais incidem, dada sua natureza de acessório, que segue o principal.
O mesmo se aplicaria a juros sobre multa de ofício. Também devem seguir o principal. “A tese em voga é de que os juros moratórios devem seguir a mesma natureza dos débitos sobre os quais incidem”, afirma a Receita na resposta.
Para Breno de Paula, do escritório Arquilau de Paula Advogados Associados, “a solução de consulta viola o conceito constitucional de renda”. Ainda segundo ele, as despesas dedutíveis do lucro real são as operacionais, aquelas necessárias à atividade da empresa
“Sempre se entendeu que as despesas financeiras eram dedutíveis, agora a Receita fez uma limitação para a dedução de juros”, afirma Rafael Serrano, sócio do CSA Advogados. De acordo com o advogado, apesar de o caso envolver um contribuinte do Pert, a forma como a Receita respondeu permite a aplicação em juros referentes a pagamentos em outras situações, como tributos discutidos na esfera judicial, por exemplo, mesmo que não tenham sido parcelados. “Tem uma amplitude maior do que se imagina.”
A Receita, diz Edison Fernandes, sócio do FF Advogados, nunca tinha se manifestado sobre isso e não havia dúvida de que juros poderiam ser deduzidos, mesmo do IR. Ele entende que nem a multa nem o juros são tributos e, por isso, poderiam ser deduzidos. “O entendimento coloca em risco os juros deduzidos do IR e da CSLL dos últimos cinco anos.”
Fonte: Valor